Entendendo as vacinas: do que são feitas ?

Anticorpos monoclonais

 

Dando continuidade ao assunto da opção de imunização ou não, publicado pela Revista IstoÉ, neste post vamos abordar o caráter técnico do processo de imunização, explicando como são confeccionadas as vacinas para cada tipo de patologia e intenção de imunização. A melhor maneira de exercer uma opção, é entender primeiramente o aspecto técnico do assunto em questão.

Um dos impactos causados pela revolução biotecnológica moderna foi uma mudança significativa na maneira como pensamos e desenvolvemos novas vacinas. Tais mudanças refletem avanços na descoberta de novos antígenos, adjuvantes, vetores ou sistemas de entrega. Embora boa parte das vacinas atualmente administradas em crianças e adultos ainda seja fruto de metodologias desenvolvidas em meados do século XX, espera-se que os próximos anos tragam um número cada vez maior de novas vacinas mais seguras e eficazes geradas a partir de técnicas de manipulação genética e produção de proteínas recombinantes em sistemas heterólogos. Neste breve relato, discutiremos alguns aspectos dessa mudança de práticas e conhecimentos aplicados ao desenvolvimento de vacinas.

A história das vacinas e sua aplicação na prevenção de doenças infecciosas acumulam mais de 200 anos de dedicação e muito trabalho. Iniciada pela genialidade e pelo empirismo direcionados de médicos e pesquisadores, como Edward Jenner e Louis Pasteur, observa-se nessa área um belo exemplo do reducionismo aplicado à prática médica. Desde as primeiras vacinas baseadas em patógenos, sejam eles bactérias ou vírus, atenuados ou inativados, muito reativos e, em alguns casos, pouco eficientes, a pesquisa vacinal moveu-se na direção de empregar frações cada vez menores desses patógenos na busca de aumentar a segurança sem comprometimento da eficácia. Dessa forma, é comum classificarmos as vacinas em três grandes grupos (ou gerações) em razão das estratégias ou dos conceitos utilizados na preparação do princípio ativo, os antígenos vacinais. As vacinas de primeira geração representam aquelas que empregam na sua composição o agente patogênico na sua constituição completa, mas submetido a tratamentos que levam à inativação ou à atenuação dos micro-organismos. Nessa categoria, também deve ser destacada a estratégia em que micro-organismos não patogênicos derivados de outros hospedeiros são utilizados como antígenos para vacinas voltadas para o controle de doenças causadas por patógenos assemelhados. Essa abordagem é bem exemplificada pelas vacinas da varíola, baseada em vírus vaccínia isolados de bovinos, e da vacina contra a tuberculose que também emprega uma bactéria originalmente obtida em bovinos, o Mycobacterium bovis (BCG). Nesse grupo, destacam-se também as vacinas voltadas para a prevenção da coqueluche ou pertússis (vacinal celular), as vacinas contra varíola, poliomielite, sarampo, rubéola, adenovírus, entre outras. Ou seja, nesta categoria estão incluídas as vacinas produzidas com o microrganismo em sua constituição completa, porém estes são tratados com o objetivo da inativação ou atenuação dos mesmos. Por isso, consegue provocar resposta imune com a produção de anticorpos sem causar efetivamente a doença.

A segunda geração surgiu com a noção de que, em alguns patógenos, a proteção vacinal pode ser obtida após a indução de anticorpos voltados para um único alvo, como uma toxina, responsável pelos sintomas da doença, ou açúcares de superfície que permitem ao sistema imune do hospedeiro neutralizar e eliminar bactérias que de outra forma se propagariam rapidamente antes de serem notadas por nossas principais linhas de defesa imunológica. Nesse grupo, destacam-se vacinas acelulares que empregam toxoides (toxinas purificadas e inativadas por tratamento químico), proteínas e polissacarídeos purificados, como as antitetânica, antidiftérica, hepatite B e as vacinas voltadas para o controle da meningite meningocócica e da pneumonia. Aqui, são utilizados partes ou produtos oriundos do microrganismo original, sendo estas partes ou produtos os responsáveis pela ativação do sistema imune, mesmo quando os mesmos estão em sua forma completa. Sendo assim, não há motivos para utilização do patógenos em sua forma completa, já que se sabe qual parte ou produto fará a ativação do sistema imune humano. Desta forma haverá a produção de anticorpos sem o desenvolvimento da doença.

Por fim, a terceira e mais recente geração de vacinas parte de um conceito inovador que a diferencia de uma forma radical das outras gerações vacinais. Nessas vacinais, emprega-se a informação genética do patógeno responsável pela codificação de proteínas que representem antígenos relevantes para a proteção. Em geral chamadas de vacinas de DNA ou gênicas, as vacinas de terceira geração foram descobertas de forma empírica no começo da década de 1990 em testes inicialmente voltados para a pesquisa de terapias genéticas em que se introduzem no hospedeiro genes que substituirão a informação genética defeituosa originalmente presente no indivíduo. Aqui, as técnicas de recombinação genéticas são utilizadas, tornando mais seguras ainda as vacinas. As doenças não tem a possibilidade de desenvolvimento pois funciona como uma “cópia” do microrganismo original só que sem sua patogenicidade.

A biotecnologia tem contribuído de forma decisiva para o aprimoramento de processos relacionados ao desenvolvimento e à produção de novas vacinas ou ao aprimoramento de vacinas já existentes para que se tornem mais seguras e eficazes.

Cada vez mais a tecnologia e os avanços das pesquisas científicas proporcionam mais segurança e eficiência no processo de imunização dos seres humanos. É muito importante acompanharmos essas evoluções estando sempre atentos ao que de melhor pode ser utilizado contra patologias conhecidas e que ainda estão por vir.

Referências:

Diniz, M. O. ; Ferreira, L. C. S. F. Biotecnologia aplicada ao desenvolvimento de vacinas; Estud. av. vol.24 no.70 São Paulo,2010; SciELO – Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142010000300003 – Acesso em: 06/06/2017

Murphy, Kenneth. Imunibiologia de Janeway / Kenneth Murphy, Paul Travers, Mark Walport; tradução de Ana Paula Franco Lambert et al. – 7ª edição – Porto Alegre: Artmed, 2010

 

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